Intrinsecamente desobedientes
Texto base: Gênesis 3:1-8, 2 Crônicas 7:14
É-nos bem conhecido o relato da queda do homem ocorrida no Éden: Encorajados por Satanás na figura de uma serpente, primeiro Eva depois Adão desobedeceram à ordem dada por Deus de não comerem do fruto da árvore localizada no meio do jardim. Em decorrência desse pecado, concretizou-se o prenunciado distanciamento entre o Criador e a humanidade, e a instauração da finitude da vida de todos os seres.
Não fosse o pecado original, inexistiriam dores, enfermidades físicas ou psíquicas, angústia, abandono, fome nem mesmo a morte. Ademais, manteríamos com Deus a comunhão de que desfrutava o primeiro casal, o qual era todos os dias, ao entardecer, prestigiado pela visitação do Todo-Poderoso. Diante desse ônus e de outros tantos prejuízos que nos sobrevieram na esteira do primeiro pecado, um leitor sincero - mas insipiente - da Bíblia certamente se indignaria diante de tamanha imprudência de Adão e Eva ao cederem à serpente. Se, todavia, esse leitor encompridasse um pouco mais suas reflexões sobre esse tema, começaria a colocar em suspeição o próprio Criador, inquirindo: “Se havia uma árvore cujos frutos os dois não poderiam comer, por que Deus a deixou no jardim? Por que não a retirou dali?” Levando ao extremo essas indagações, em algum momento se questionaria: “Se, considerando sua onisciência, o Senhor sabia que os dois pecariam estando lá a árvore, por que, mesmo assim, a manteve?”
Realmente, face à onisciência, Deus sabia que os dois cairiam. Quanto a isso não há disputa. Desse modo, as perguntas que devemos fazer devem perseguir outro tipo de resposta. Uma vez que o texto bíblico já está estabelecido, uma vez que o relato já está registrado, mais sensato será nos perguntarmos: “O que o Espírito Santo deseja que extraiamos desse trecho? Que lição Ele nos deseja passar?” ou “Quais os propósitos de Deus para nós ao proceder da forma como está escrito?”.
Seguramente um dos ensinamentos advindos dessa passagem é este: Se formos deixados sozinhos, isto é, por nossa própria conta, jamais obedeceremos por completo a Deus. Quando a Bíblia afirma que as nossas justiças são como trapos de imundícia diante de Deus (Isaías 64:6), podemos entender essas “nossas justiças” como aquelas obras que fazermos para nos justificar a nós mesmos, pois são ações que levamos a cabo sem a direção do Espírito Santo. Não há, em absoluto, possibilidade de agirmos de modo inteiramente agradável ao Senhor sem a Sua intervenção.
Quanto à nossa incapacidade de fazermos algo bom por nossa própria conta, as Sagradas Escrituras são categóricas:
· O homem é mal desde criancinha (Gênesis 8:21);
· Nenhum ramo pode dar fruto por si mesmo se não permanecer na videira (João 15:4);
· Não faço o que quero, mas o que aborreço isso faço (Romanos 7:15);
· É Deus quem efetua em nós tanto o querer quanto o fazer (Filipenses 2:13).
Há diversas outras declarações nesse sentido salpicadas nos textos sagrados. A mais enfática, entretanto, por dizer respeito à salvação, encontra-se em Efésios 2:8-10: Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras para que ninguém se glorie; porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas.
Note-se, primeiro, a afirmação de que a salvação não vem das obras para que ninguém se glorie; segundo, que as boas obras foram preparadas por Deus para nós. Como consequência imediata dessa asserção, qualquer coisa que façamos boa e aceitável aos olhos de Deus, as fazemos porque Ele de antemão as preparou para nós; somos meras ferramentas usadas pelo Espírito Santo para a operação dos desígnios divinos.
Em Gálatas 5, a partir do versículo 22, vemos listados os frutos espirituais. Acaso já presenciou uma bananeira gemer ao parir um cacho de bananas? Não, evidentemente; ela não emprega força para frutificar, mas o faz com fluidez e naturalidade. Assim são as obras guiadas e dirigidas pelo Espírito Santo: Não as fazemos porque temos de cumprir este ou aquele mandamento, mas porque somos impulsionados por Deus.
Antes de concluir, faz-se mister, nesse esforço intelectual para compreender a obra de redenção de Cristo, retirarmo-nos do centro das atenções e colocarmos a quem é de direito: O próprio Jesus. Enquanto não estivermos inculcados com a ideia de que toda boa dádiva ou algo essencialmente bom vêm de Deus, e que nossa disposição natural é sermos inimigos de Suas vontades, jamais compreenderemos o quão importante Jesus é em nossas vidas. Se acharmos que há um único fio de cabelo digno em nossa cabeça, para esse fio Jesus não é relevante; mediante suas próprias justiças ele entraria no Reino sem a necessidade de submeter-se ao nosso Senhor, pois a obra realizada na cruz não lhe diria respeito.
Num texto bastante conhecido, lemos em 2 Crônicas 7:14: Se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, e orar, e me buscar, e se converter dos seus maus caminhos, então eu ouvirei dos céus, perdoarei os seus pecados e sararei a sua terra. Repare que a primeira condição imposta para que sejamos ouvidos e remidos é a auto-humilhação, algo que faremos ao nos prostramos diante do nosso Senhor Jesus, colocarmos a nossa boca no pó e clamarmos a Ele por misericórdia, à semelhança do publicano quando entrou no templo para orar.
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