O sentido da Fé

Texto base: Marcos 4:35-41

           

             O trecho em análise conta que certa vez Jesus e seus discípulos, rumando à outra margem do Mar da Galileia, se viram pegos de surpresa por um forte temporal de vento. Tamanha a força dos ventos, as ondas lançavam água para o interior do barco.

            Tomados de grande temor pela vida, os discípulos ficaram perplexos quando perceberam que Jesus estava à popa dormindo sobre uma almofada. Acordando-o sem hesitar, perguntaram-no se não se importava que perecessem. De pé, pôs-se a repreender o vento e as águas, após o que houve calmaria. Dirige-se para seus seguidores e lhes pergunta: Por que sois tão tímidos? Ainda não tendes fé?

            Confesso que já ouvi alguns sermões embasados nesse texto; todos eles o utilizavam para dar significado ao conceito de fé, na Bíblia, sendo unânimes quanto ao sentido a ela atribuído. Os pregadores ouvidos, como que por consenso pleno, transmitiam a clara sensação de que fé não era outra coisa senão um pensamento positivo através do qual nossos desejos são concretizados, pois esse pensamento positivo é a chave que abre o baú de bênçãos que Deus quer derramar sobre nós. Desse modo, tendo-se fé, isto é, com positividade de pensamento, conseguiremos um carro, uma casa, dinheiro, emprego, saúde, família ou qualquer que seja o presente que queremos de Deus receber; basta que mentalizemos e estejamos convictos de que nossos pedidos serão atendidos.

            Não posso crer que é isso o que o Senhor quis dizer aos que estavam no barco; não creio que Jesus tenha repreendido os discípulos pelo fato de ele ter de fazer o que eles poderiam ter feito por via da fé – dizer ao mar e aos ventos para se aquietarem. Outrossim, considerando a Bíblia por inteiro, em vez de me restringir a um ou outro excerto, é difícil conceber que ter fé signifique meramente em criar pensamentos positivos.

            Com efeito, quando olho para a Bíblia como um todo, vejo o apóstolo Paulo: Homem de Deus, para quem Jesus por diversas vezes apareceu em visões; homem que recebeu o privilégio, conforme ele mesmo relata, de subir ao terceiro céu, ao paraíso, e lá ouvir e ver coisas as quais não lhe foi permitido comunicar aos demais cristãos de forma oral ou escrita; homem versado em todos os dons espirituais, desde sabedoria ao dom de curar, passando por profecias e variedades de línguas. Pois bem, esse mesmo homem, acometido por enfermidade por ele comparada a um espinho na carne (2 Coríntios 12), por três vezes clamou a Deus libertação e cura até receber um sonoro "não!".

            Por que Deus não o curou? Poderíamos dizer se tratar de falta de fé? Veja só, preste atenção à abreviada descrição que dele fiz. Acha mesmo que esse homem não tinha fé? É claro que tinha, ninguém pode negar! Deus não o curou, seguindo a leitura do texto, porque havia um propósito maior: O Senhor intentava mostrar a Paulo que a graça Dele lhe bastava, que ele se tornava forte justamente naqueles momentos em que se achava mais fraco.

            De modo similar poderíamos atentar para o caso de Jó: Um homem que, após perder tudo – bens materiais, filhos e saúde – quando instado por sua mulher a blasfemar contra Deus, diz: Recebemos o bem da parte de Deus, e não receberíamos o mal? Deus me deu, Deus tomou, bendito seja o nome do Senhor! Acaso esse homem, após ter sido espoliado de tudo, não tinha fé? Ele padeceu tamanha aflição porque não teve fé suficiente? Certamente não! Jó era um homem reto, íntegro e temente a Deus. Aliás, não foi nem mesmo Satanás que tomou a iniciativa, mas Deus, ao inquirir ao Maligno: Viste meu servo Jó?

            Deus tem um propósito em tudo. Teve na ocasião de Jó, permitindo que fosse afligido com tão grande aflição; teve ao negar cura para a enfermidade de Paulo; assim como tem para conosco, seus filhos por adoção mediante Cristo. E sabemos que Ele é bom, apesar de não compreendermos muitas coisas, como o próprio Jó não compreendia por que sofria tanto. Sabemos que Ele é bom porquanto deu o seu único filho para que, através de sua morte, fôssemos reconciliados com Ele, e herdássemos o Reino que há de vir.

            Voltando para a história do barquinho em meio à tempestade, uma dúvida ainda permanece de pé: Por que Jesus questionou a fé dos discípulos?

            Penso que a explicação é a seguinte: Se lermos os versículos anteriores a esse relato, veremos que Jesus havia realizado inúmeros milagres no meio do povo, a olhos vistos de todos. Isso posto, o questionamento à fé dos que o acompanhavam no barquinho está, sim, ligado à fé que eles tinham não em si mesmos, mas no próprio Jesus; pois se Ele manifestara estar imbuído do poder de Deus de maneira clara e indisputável, qual a razão de temer pela vida, como se toda aquela grandiosa missão fosse ser interrompida em definitivo por uma tempestade num lago?

            Em suma, Jesus quis dizer a eles – e, através do Espírito Santo, a nós – que enquanto Ele estiver no barco da nossa vida, não devemos nos preocupar, pois tudo estará sob Seu controle. Não devemos ter medo das adversidades, sejamos pegos de súbito ou não, porque se Cristo está conosco, nada dará errado. Amém!

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